E é tudo
Há vezes, e não poucas
em que a voz se solta
a galope num trote voraz
irada, porém incapaz
pois que nenhum som, nada.
E é tudo.
© Copyright Miguel Santos Teixeira
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Há vezes, e não poucas
em que a voz se solta
a galope num trote voraz
irada, porém incapaz
pois que nenhum som, nada.
E é tudo.
© Copyright Miguel Santos Teixeira
sabes que horas são?
Um cigarro ajudava à questão
faz-se fumo e desvanece-se a ocasião
e o tempo não parou, nem por isso
olho os ponteiros e vejo-os em fuga
tinha-te mesmo aqui
à distância da minha mão
mas bastou falar das horas
© Copyright Miguel Santos Teixeira (2024)
Nada é meu
Da mesma forma que nada é teu
Ou de alguém
A possessão é algo que nos morre
Que finda junto com a nossa morte
Ter, possuir, é meu, é teu, na verdade não é de ninguém
É antes perpétuo, do universo e por isso resiste aos nossos dias
Não é meu, não é teu, nem sequer de alguém
É engano pensar que o detemos, seja o que for, quem for
Nada nos pertence
Hoje, ontem em tempo algum
Somos o que somos e de passagem estamos
Tudo é ilusão, desde o que pensamos que podemos ao que julgamos
que temos
Nada de nada
Nesta estada de milésimos, nem o que contemplamos nos acompanha
Nem isso nem qualquer façanha
Tudo é cenário, apenas paisagem
Que na nossa memória, apenas e só, ilustra a viagem
© Copyright Miguel Santos Teixeira
voava alto, se pudesse
ia para lá de onde se esquece
e fazia ninho, mas sem me quedar
que o que eu quero é voar
© Copyright Miguel Santos Teixeira (2024)
a honestidade não se compara à chuva
embora eu a dance sempre que a sinto
a celebre como bênção herdada do fel
da dor que dói de todas as vezes que te minto
© Copyright Miguel Santos Teixeira (2024)
nas asas daquelas famigeradas linhas
escrevi-te um verso sem nexo
que nunca sequer te vi
nem de longe
menos ainda de perto
© Copyright Miguel Santos Teixeira (2024)
o céu fechou-se, cerrou fileiras
as suas pesadas pálpebras
e precipitou-se
sobre os indefesos, amedrontados
zangado, antes berrou, soltou toda a sua fúria e estalou brutal na vastidão abissal
ecoando seco e ameaçador
sobre os incautos, pecadores
irou-se e tudo alumiou na noite que impôs, então compôs, a seu tempo, compassada, a seu jeito, cerrada
e sobre todos se lançou
na brava impetuosidade do seu ser
a todos enlaçou
na prepotência do punho ditatorial
brotando salvas que ressoaram pelos confins do seu reino
qual homenagem fúnebre a um herói nacional
espezinhado a seus pés, impotente
qual castelo de areia
indefeso animal
© Copyright Miguel Santos Teixeira (2013)
femina
ela, femina
mãe de todos
deles, delas, das outras mães
carregam a vida, são vida
dão-na, perpetuam a espécie
numa espécie de força avassaladora
nos modos como intentam e se mostram deusas
uma basta por todas, mas todas são o mar inteiro
céu, terra, ar e fogo
que vem lá bem do fundo
de tempos infindos
de peitos sofridos, gargantas roucas
punhos erguidos na luta
nas conquistas, na esperança por outras
nessa mulher que existe em cada um de nós
ela, femina
deusa, nossa mãe.
© Copyright Miguel Santos Teixeira (2024)
dizem que sou único
que como eu não existe outro
e as nuvens? e as ondas? e as árvores?
e o vento? que sempre que sopra, sopra diferente
e um olhar? que nunca se queda num só lugar
e um pensamento? que num abrir e fechar de olhos já anda a vaguear
e imaginar? que pode ser tanta coisa sem par, basta pensar
e tudo? à minha volta, à vossa, à de todos
que ninguém é duas vezes
apenas semelhante ao seu vizinho
de casa, de prédio, de rua, de cidade, de país, de continente
que nem o amor, que eu quero igualmente repartido por ti, por ti e por ti
e que nunca chega, sempre escasso, à distância por vezes de um simples abraço
mas nunca igual, apenas único
como cada qual
© Copyright Miguel Santos Teixeira (2013)
são formas que se movem
de vontade ressequida
como espantalhos perdidos ao vento
munidos do que julgam ser vida
repetem esquinas
alongam avenidas
são sombras, são espectros
em becos sem saída
não sabem o que seguem
não sabem ao que vão
são figuras agastadas
subtraídas de paixão
compõem-se bem, alguns a rigor
que ainda são gente, gente que sente
um aperto no coração, uma angústia, um tremor
solidão que mói, qual maleita persistente
já não sabem nem sonham
que a vontade foi a enterrar
são carcaças rendidas, de asas partidas
numa vida que já só é restos
até do tempo que ainda tem para lhes dar
mais mortos que vivos, num constante pesar
eles deixam-se ir, deixam-se levar
no dorso desse tempo que a todos há-de arrastar
mais estes que nem trapos
sem regresso ou volta a dar
e assim desfila este capítulo sem história
a seus olhos final, sem glória
lembrado em lápide de néones brilhantes
já sem nada, nem mesmo memória
já nada como dantes
© Copyright Miguel Santos Teixeira (2013)