por migalhas, em 14.11.24
A confirmação que faltava.
Agora só fica a faltar a vossa presença, algo que muito me encheria de alegria.
Quem quiser e puder aparecer nesta data, lá me encontrará a tentar dar o melhor num evento que, espero, seja, não do tamanho da minha altura mas sim, do tamanho dos meus sonhos.
Conto convosco?
por migalhas, em 07.03.24
não sei o porquê de seres tu
entre incontáveis figuras
frágeis e tão pequeninas
a brincarem às vidas neste lar pedregoso
a olharem o céu à noite e a depositarem desejos numa singela estrela
a rezarem para que assim, por mim, por este e por aquele
na ilusão de um amanhã a todos omitido
revelado ao minuto, nunca de véspera
e logo tu, de entre tantas respirações que se sustêm
como sementes, miraculosamente germinadas
como folhas, de verdes a douradas
num ciclo de vida que nos leva a galope
por entre dias céleres e afazeres sem conta
ele que nunca faz de conta, sempre se perfaz depressa
que a sua missão é essa
passo estugado, olhar adiantado
numa cilada que a todos deixa asfixiados
por ele rodeado, a toda a volta, por todo o lado
a cada espaço mais e mais mirrado
e menos uma hora
e lá se foi outra aurora
e tu, de entre todos estes crono serviçais
filhos de uma rota pré determinada
toalha ao chão e nada mais
impassível, num olhar que se demora
eternizado neste que sou agora
que amanhã não sei
© Copyright Miguel Santos Teixeira (2013)
por migalhas, em 01.03.24
são formas que se movem
de vontade ressequida
como espantalhos perdidos ao vento
munidos do que julgam ser vida
repetem esquinas
alongam avenidas
são sombras, são espectros
em becos sem saída
não sabem o que seguem
não sabem ao que vão
são figuras agastadas
subtraídas de paixão
compõem-se bem, alguns a rigor
que ainda são gente, gente que sente
um aperto no coração, uma angústia, um tremor
solidão que mói, qual maleita persistente
já não sabem nem sonham
que a vontade foi a enterrar
são carcaças rendidas, de asas partidas
numa vida que já só é restos
até do tempo que ainda tem para lhes dar
mais mortos que vivos, num constante pesar
eles deixam-se ir, deixam-se levar
no dorso desse tempo que a todos há-de arrastar
mais estes que nem trapos
sem regresso ou volta a dar
e assim desfila este capítulo sem história
a seus olhos final, sem glória
lembrado em lápide de néones brilhantes
já sem nada, nem mesmo memória
já nada como dantes
© Copyright Miguel Santos Teixeira (2013)
por migalhas, em 02.01.24
acabo de morrer
deixei de olhar, de ver
o meu pénis entesa-se na perspectiva de me sobreviver
é dor, é prazer
num duelo de forças que não permite saber
quem sobrevive, quem no fim irá perecer
pesado ficou o ar
assim a terra, fogo e mar
deposta a derradeira vontade
num augúrio de imparável mortandade
coisa cortante, matéria nefasta
que a todos arrasta
a todos dilacera, nunca pela metade
sem credo ou idade
qual canto do cisne
capítulo final
assunto encerrado
pena capital
© Copyright Miguel Santos Teixeira (2013)
por migalhas, em 27.12.23
Acordei e morri.
Nem um suspiro, um sussurro e faleci.
Um instante, uma efémera memória, foi tudo o que ficou de mim.
E a terra húmida a cobrir-me o corpo nu.
A ver-te partir, vida que nem vivi.
Olhos raiados, cegos, surdos e mudos de tudo aquilo que nunca vi.
Ali especados, incrédulos, a olharem o mundo como só eu o vi.
Que carrego tão leve é este, que nem o senti?
Foi por viver breve?
Que nada, nem ninguém.
Apenas o diabo que me leve.
© Copyright Miguel Santos Teixeira (2013)
por migalhas, em 30.11.23
por quantos infernos já passei?
enclausurado ao mundo empírico e por ele ignorado
dele repelido como um escravo a que nada é permitido
nesta vida que nos cobra cada registo falhado
em papel timbrado, em folhas repassadas e com elas a história
o tempo que se escoa e eu com ele
de tudo afastado e neste estado omitido
que o nada se interpõe e de mim faz troça
ao que faço faz vista grossa
e cínico no ar espalha a mentira
que repetida aos sete ventos se torna verdade
maior a crueldade
para quem se queria parcela deste mundo
mas nele perdeu quanto tinha
a fé, a esperança, a identidade
© Copyright Miguel Santos Teixeira (2013)
por migalhas, em 28.11.23
há uma ideia da morte
feita apenas em vida
de que ela nos é devida
como coisa merecida
no fim desta corrida
que um dia nos foi oferecida
como a mão da noiva comprometida
a que juramos fidelidade indefinida
como indefinida é a vida
e essa morte prometida
como cada passo que nos conduz
de um extremo ao outro desta linha em que avançamos
rumo à luz
que, por fim, alcançamos
às cegas, é certo
que nada é o que julgamos
de identidade indefinida
o que faz, faz sem maldade
como coisa merecida por esta vida oferecida
que não escolhe idade
ou tempo de validade
agora e na hora da nossa
seja feita a sua vontade
© Copyright Miguel Santos Teixeira (2013)
por migalhas, em 24.11.23
De cada dia existe uma parcela que me escapa
Um par de horas
(quase sempre mais, dois pares, talvez até três)
que me são omissas, que em permanência não lhes chego sequer a sentir o sabor
São horas que passam na minha ausência, mas que contam tanto como as outras no acumular de todas as que um dia se me irão somar
Horas que se adicionam às de uma vida, mas que as não vejo ou sinto como horas
São quase sempre horas nocturnas, horas adormecidas em que também eu me embalo rumo ao paralelo mundo dos sonhos
Nessas horas é o silêncio quem ergue a sua voz e do alto da sua solenidade acrescenta tempo ao tempo que me perfaz
E quando acordo
(na manhã seguinte a essas horas que nem as vivi, sequer senti, apenas se perfizeram porque são essas as suas ordens)
sou eu mais essas horas por companhia, por sombra que me segue e acompanha e acrescenta camadas de tempo ao tempo que já somei, bem cimentadas na pessoa que sou e de que só as rugas e toda a degradação deste meu ser
(que são consequência sua)
me fazem saber que passaram por mim
(também elas passaram por mim)
mesmo sem lhes ter chegado a sentir o sabor
um leve trago desse existir amargo
que me soma tempo sem permissão
que me acelera o passo para o outro lado
© Copyright Miguel Santos Teixeira (2013)
por migalhas, em 22.11.23
e o eléctrico?
ao longo do corredor de carris em ferro
fazendo deslizar o todo das almas
e nesse percurso escoando quantas memórias jamais perdidas
a espaços eternizadas no momento
naquele momento vidrado de quem olha pelo espaço que se retrata na paisagem e por ele deambula
encantado
tão encantado quanto tudo o que é vida e movimento que se perpétua na raiz de quanto ainda está para ser
em breve futuro feito presente
presente feito passado.
© Copyright Miguel Santos Teixeira (2013)
por migalhas, em 21.11.23
ensaio