Não me peçam para falar em público
Não me peçam para falar em público
Por favor, suplico-vos
A exposição faz-me mal
A ribalta não é para mim
Não se arrisquem
não se sujeitem, e a mim também
Ali exposto, a vós, aos mortos, aos espíritos dos antepassados
Entre a espada e essas quatro paredes que me comprimem o peito
Retalham a respiração, me toldam a visão
Se ainda se mutilassem
Todos vós os olhos arrancassem, os ouvidos perfurassem, a língua cortassem
As mãos, sim as mãos, que para tanto servem, decepassem
Se por igual se despissem, todos, nu integral, como ao mundo vieram
Se assim diminuídos a sala abandonassem, em romaria, como quem, afinal, não queria
assistir a esta porcaria!
Ainda assim evitaria
Não, recusaria!
Determinantemente! Uma e outra vez
Que em público mudo sou e já não mudo
Estou bem assim, como estou.
© Copyright Miguel Santos Teixeira (2023)