Só o ano é novo
O ano é novo, mas nada mais.
Nem as intenções, nem os desejos, nem os sentimentos, nem as pessoas que os vestem.
Do que julgamos conhecer ou supomos assim ser, já novidade alguma transparece.
O ano é novo, mas nada mais.
Tudo é recorrente, tudo é mais do mesmo a que atribuímos um rótulo diferente.
Vivemos na repetição dos dias, que se sucedem ao ritmo de um relógio viciado que nos turva a visão de uma realidade que não esta.
O ano é novo, mas nada mais.
As acções, sempre as mesmas, deixam-nos presos os movimentos, o corpo adormecido, a mente anestesiada por imagens que passam em replay, numa televisão que nunca se desliga. Nem eu. Sempre atento, embora já nada exista para atentar.
O ano é novo, mas nada mais.
Nem a música, que se ouve em fundo num palco vazio de actividade onde eu me sinto perdido a cada peça que sobe à cena e por ela se arrasta.
As figuras, os papéis, as personagens, tudo se move como assombrações que efectivamente são. Pois já nada é novo.
Nem mesmo o cenário, o pano de fundo estafado que agora apenas se deteriora.
Olho-me no espelho e observo que nada mais é novo.
Senão o ano.