O meu amigo do outro mundo
por migalhas, em 09.07.04
Conheci recentemente um fulano simpático com quem, desde então, vou trocando alguma correspondência. Até aqui, tudo normal. Mas a verdade é outra, bem mais insólita. É que este meu amigo - que já considero assim embora o tenha conhecido à apenas meia dúzia de dias - não é deste planeta. Ora bem. Por esta é que não esperavam, suponho. Nem eu. Pois o fulano bem que me enganou na altura, ao apresentar-se como presidente da câmara de Lisboa. A princípio ainda desconfiei. Então este gajo vem-me agora com a conversa de que é o Santana Lopes? Nã! Mas a verdade é que a cara era a dele e os modos batiam certo com aquilo que me haviam contado. Uma breve troca de palavras e depressa concluí que se tratava realmente do nosso futuro primeiro. O encontro foi casual e ocorreu devido à minha especialização em captações de água no subsolo. Uma reunião de trabalho no espaço da câmara para tratar de assuntos que nada tinham a ver com o pelouro de sua excelência, alertaram-no, no entanto, para as minhas credênciais. A urgência que mostrou em falar comigo, desde logo me fez concluir que o senhor era alvo de uma necessidade inadiável. Já no seu escritório, igualmente no palácio da câmara, fui convidado a segui-lo, não num dos seus elaborados raciocínios mas, e para meu grande espanto, numa pequena viagem pela nossa galáxia. Apanhado completamente desprevenido, vi-me subitamente a descer em direcção às traseiras da câmara para entrar numa nave estranhíssima que ali se encontrava camuflada debaixo de umas quantas vides. O senhor presidente tomou o comando das operações, algo a que já se começava a habituar, e colocou a nave em espaço aéreo português num abrir e fechar de olhos. A primeira paragem desta alucinante viagem, foi alguns segundos depois no Caramulo. Na serra onde se produz a água mineral natural que é comercializada e bebida por muitos de nós, todos os dias. A pausa foi aproveitada para atestar o depósito do veículo e foi então que fiquei a saber que este apenas funcionava a... água do Caramulo! Curioso. De seguida, e já de depósito cheio, percorremos em pouco mais de meia hora os vários planetas do nosso sistema solar. Durante o percurso, que não consegui deixar de apreciar com olhos de quem nunca tinha ido além do Cabo da Roca, sua excelência elucidou-me de que estava com um grave problema. Desde que visitara o nosso humilde planeta, e no qual ficara já lá íam uns bons anitos, descobrira que o único combustível capaz de fazer voar o seu veículo espacial era a água do Caramulo. Até aqui, tudo bem. Mas o problema era outro. As reservas de água desta fonte natural estavam visivelmente nas últimas e muito desta situação devia-se ao excessivo consumo que ele fazia da mesma, para se poder deslocar para aqui e para ali sempre que lhe apetecesse. E, mais grave ainda, nenhum outro planeta do nosso sistema - como ele me mostrou durante a nossa viagem relâmpago -, possuía um substituto à altura que lhe permitisse continuar a alimentar o depósito desta sua engenhosa máquina espacial. De volta ao seu escritório, já em terra firme, fui então informado da razão de ter sido eu o eleito para o ajudar. Tudo se resumia ao túnel do Marquês e ao segredo que este escondia. Soubera ele, em resultado de umas análises feitas em tempos naquela zona onde agora está embargada a obra do túnel, que algures por ali, no subsolo, existia um enorme lago cujas características da água se assemelhavam em demasia às apresentadas pela sua congénere do Caramulo. Ou seja, talvez ali residisse a tal luz ao fundo do túnel. E com a minha colaboração nessa análise mais aprofundada, quem sabe estivesse encontrada a solução para o seu caso. Explicada a situação, acedi a ajudá-lo mas em troca de umas quantas exigências. Não podia deixar passar esta oportunidade sem dela tirar o melhor partido possível. Assim, comecei por exigir que ele convencesse a Cinha Jardim a deixar de fazer comentários desportivos, a que ele acedeu. De seguida, passei a exigir que, se viesse a ser primeiro-ministro, me conseguisse um qualquer job cá para este boy, a que ele acedeu. E por fim, mas nem por isso menos importante, exigi ainda que se candidatasse de novo ao cargo de presidente do Sporting e, uma vez eleito, contratasse o grande Diego Maradona para a equipa e mandasse chamar de volta o pequeno João Pinto. E expliquei-lhe porquê. O Diego cheirava as linhas do campo e uma vez sem marcações, o João podia atirar-se à vontade para o chão que era sempre pénalti. Havíamos de ser campeões até se extinguir o futebol. A que ele também acedeu. Selámos ali o nosso acordo com um aperto de mão e agora só espero que a água que o túnel do Marquês esteja a meter seja semelhante à do Caramulo. Ou nunca mais o meu Sporting ganha um título que seja.