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TUDO É ILUSÃO, DESDE O QUE PENSAMOS QUE PODEMOS AO QUE JULGAMOS QUE TEMOS.

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SOBRE UM POEMA

por migalhas, em 27.04.12

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

SOBRE UM POEMA

Um poema cresce inseguramente
na confusão da carne,
sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto,
talvez como sangue
ou sombra de sangue pelos canais do ser.

Fora existe o mundo. Fora, a esplêndida violência
ou os bagos de uva de onde nascem
as raízes minúsculas do sol.
Fora, os corpos genuínos e inalteráveis
do nosso amor,
os rios, a grande paz exterior das coisas,
as folhas dormindo o silêncio,
as sementes à beira do vento,
- a hora teatral da posse.
E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.

E já nenhum poder destrói o poema.
Insustentável, único,
invade as órbitas, a face amorfa das paredes,
a miséria dos minutos,
a força sustida das coisas,
a redonda e livre harmonia do mundo.

- Em baixo o instrumento perplexo ignora
a espinha do mistério.
- E o poema faz-se contra o tempo e a carne.

HERBERTO HELDER

À conversa…

por migalhas, em 23.04.12

-       Tu sabes bem que para mim és como uma filha. Aliás, tu és a quarta filha que eu nunca tive.

-       Quarta? Mas a senhora só tem duas filhas.

-       Sim, e uma sobrinha.

 

© Copyright Migalhas (100NEXUS_2012)

2 Amigos à conversa…

por migalhas, em 05.04.12

- Então o almoço, correu bem?

- Sim, estava óptimo, chocos.

- Quê?

- Chocos.

- Que é isso?

- Chocos? Então não sabes o que são chocos?

- Sim, sei. Mas pensei que tinhas dito que o almoço tinha sido óptimo.

- Sim, e foi. Mas o que é que isso tem a ver?

- Então como é que pode ter sido óptimo se meteu chocos? Eu da última vez que me lembro de ter tido um choco fiquei piurso!

- Quê?

- Sim, daquela vez que choquei com aquele paspalho que se esqueceu de arrancar no semáforo. Foi um choco e peras! Passei-me!

- Ah, um choque. Como quando chocaste com esse tal gajo.

- Exacto, foi o que eu disse. E tu dás também um choco e ficas todo contente? ‘tás pior.

- Eu não dei nenhum choque, eu comi chocos ao almoço, entendes? E estavam muita bons.

- Comer chocos? E bebeste para lá da conta, também.

- Então e porquê?

- Rapaz, um choco, estás a ver?

- Sim…

- Há vários tipos de chocos. Uns mais fortes, outros menos. Como quando sem querer chocas com uma pessoa na rua, por exemplo. Ou quando metes as mãos numa tomada e apanhas um choco daqueles que até te pelas, ‘tás a ver? Ou então como aquele que dei naquele paspalho, quando o meu carro chocou com o dele. Chocos, entendes?

- Isso são choques. Choques, queres tu dizer. O que eu comi foram chocos, aquela cena tipo lulas, sabes?

- Tipo lulas? A única coisa tipo lula que conheço é quando alguém amanda uma daquelas escarretas enormes, que um gajo até diz: caganda lula, sim senhor! Foi isso que almoçaste?

- Que nojo, oh pá! Que nojo de conversa.

- Tu é que falaste nisso, das lulas. Vou beber café, queres?

- Sim, traz-me um café cheio e um guardanapo.

- Não precisas, tens aí papel de cozinha.

- Não, o bolo, um guardanapo, sabes quais são? Aqueles assim, em forma de… guardanapo.

- ‘tás a ver! Lá ‘tás tu outra vez, sempre em choco comigo. És lixado, pá.

 

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