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100Nexus

TUDO É ILUSÃO, DESDE O QUE PENSAMOS QUE PODEMOS AO QUE JULGAMOS QUE TEMOS.

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chegaste

por migalhas, em 21.06.11

chegaste

e nem te anunciaste

que não é preciso, és quem és

naquilo de que és feito, perfeito

intenso na luminosidade, no calor abrasador

nos dias maiores, no campo, na cidade

és louvado, ansiado, o mais desejado

e mesmo ao deitar da luz, na calma que depois se produz

é o teu bafo quem manda, quente, dormente

que a brisa depois enlaça e num terno abraço apazigua

amolece e embala com laivos de paixão

até que dessa lícita união, fruto do vosso ventre

a nova alvorada dêem razão

e com ela novo reinado de um brilho como nenhum outro

de dias a fio de canícula

de sorrisos rasgados, de olhares embalados

de corpos contigo deleitados

como oferendas por te lembrares

por nos agraciares e esta fome saciares

nos fecundares neste leito de tantos suores

azul acima, azul abaixo

desde este teu primeiro dia

ao que, ainda tão longe mas já saudoso

marcará a tua breve despedida

nem anunciada

partiste

 

inédito de migalhas (100NEXUS_2011)

pedaços dos meus frágeis passos

por migalhas, em 20.06.11

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

É nas palavras que me refugio

Nesse amontoado de tanta coisa

Composição de passo terno, legado eterno

 

(...)

 

Excerto do poema tudo o resto que é tudo tirado do meu Frágeis passos, negros hábitos - poemário 1, disponível em http://www.bubok.pt/libros/3564/frageis-passos-negros-habitos--poemario-1

outra parte deste todo

por migalhas, em 17.06.11

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Arrisco a vida

Pois a morte sei-a garantida

Nada vislumbro, não vejo saída

O tempo parou e o sinal mudou

Vermelho, agora em mim encarnado

 

(...)

 

Excerto do poema linha terminal tirado do meu Frágeis passos, negros hábitos - poemário 1, disponível em http://www.bubok.pt/libros/3564/frageis-passos-negros-habitos--poemario-1

parte do todo

por migalhas, em 16.06.11

 

Sou peão incauto neste comum xadrez

Mundo redondo de 4 cantos

Um dia é tudo, tudo de uma só vez

Outros há em que morro mudo, intoxicado

Tormentos mil que me sufocam

Outros tantos são desencantos

 

(...)

 

Excerto do poema nem belos prados tirado do meu Frágeis passos, negros hábitos - poemário 1, disponível em http://www.bubok.pt/libros/3564/frageis-passos-negros-habitos--poemario-1 

Não és os Outros

por migalhas, em 15.06.11

Não há-de te salvar o que deixaram
Escrito aqueles que o teu medo implora;
Não és os outros e encontras-te agora
No meio do labirinto que tramaram
Teus passos. Não te salva a agonia
De Jesus ou de Sócrates ou o forte
Siddharta de ouro que aceitou a morte
Naquele jardim, ao declinar o dia.
Também é pó cada palavra escrita
Por tua mão ou o verbo pronunciado
Pela boca. Não há pena no Fado
E a noite de Deus é infinita.
Tua matéria é o tempo, o incessante
Tempo. E és cada solitário instante.

Jorge Luis Borges, in "A Moeda de Ferro"

e por vezes

por migalhas, em 14.06.11

E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos E por vezes


encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes


ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos


E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos

 

David Mourão-Ferreira

Obra Poética 1948-1988

eu versus Julio Ramón Ribeyro

por migalhas, em 13.06.11

Ao ler Prosas Apátridas, de Julio Ramón Ribeyro, fui dar com um tema sobre o qual também eu já me havia debruçado e sobre ele reflectido.

 

Diz ele então no fragmento 78 deste seu livro:

Para um pai, o calendário mais verdadeiro é seu próprio filho. Nele, mais que em espelhos ou almanaques, tomamos consciência do transcurso dos dias e registamos os sintomas de nossa deterioração. O dente que a ele sai é o que perdemos, o centímetro que cresce é o que diminuímos, as luzes que adquire são as que em nós se extinguem, o que aprende é o que esquecemos e o ano que soma é o que nos é subtraído. Seu desenvolvimento é a imagem simétrica e invertida de nosso consumo pois ele alimenta-se de nosso tempo e constrói-se com as amputações sucessivas de nosso ser.

 

E sobre esse mesmo tópico, digo eu a certa altura num dos meus livros:

(...) Como se o crescimento deles nos sugasse vida, se sustentasse nas nossas defesas, as que tentamos erguer para não envelhecer, e assim tombassem por terra no momento em que nos apercebemos de que todo esse processo evolutivo deles é imparável e logo também o nosso. (...)

 

É esta a beleza da escrita, da literatura, de ler outros autores, de os descobrir e, no processo, descobrirmo-nos também a nós.

Haruki Murakami, The Art of Fiction No. 182

por migalhas, em 06.06.11

 

Uma interessante entrevista do autor de "Sputnik meu amor" a merecer atenta leitura.

Por que é de leituras que por aqui sempre se fala.

 

http://www.theparisreview.org/interviews/2/the-art-of-fiction-no-182-haruki-murakami

 

 

um dia fui criança

por migalhas, em 01.06.11

um dia fui criança, ainda me lembro

o mundo enorme e eu insecto

e eu bombeiro e eu guerreiro e eu sempre a sonhar

era criança e tanto que não sabia e então descobria

cada dia novas metas, novas conquistas

tudo era fome, curiosidade, imediata paixão


um dia fui criança

e nunca me hei-de arrepender

do que foi aprender, de a cada dia mais e mais saber, e eu sem me aperceber a crescer

a perder contacto com aquele insecto de que a certa altura me fui esquecendo

onde ficou ele? perdeu-se e não me acompanhou nesta viagem?

gostava dele, da sua companhia, das suas ideias loucas, das brincadeiras e trapalhadas em que se metia


um louco, esse insecto

tenho saudades dele e pena que não me faça agora companhia

tem dias que bem queria, que bem me apetecia andarmos só os dois, a esquecer as regras e a fazer apenas o que é proibido

eu e ele por aí, a esquecer os crescidos, a sermos dois insectos, a sugarmos tudo de cada dia, a sermos crianças adornadas de uma imensa alegria


que ser criança é nada pedir

é existir e tudo ter de descobrir

é rir, é dar gargalhadas de coisas parvas

é deixar à roda a cabeça dos nossos pais

é esgotarmos energias até não podermos mais


um dia já fui um insecto, pequeno, irrequieto

um miúdo, uma criança, um orgulhoso analfabeto


que posso eu fazer para nunca mais deixar de o ser?

 

inédito de migalhas (100NEXUS_2011)