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TUDO É ILUSÃO, DESDE O QUE PENSAMOS QUE PODEMOS AO QUE JULGAMOS QUE TEMOS.

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Palavras

por migalhas, em 24.06.08

A conversa é tanta que já nem sei.
Se fala apenas ou discursa numa retórica argumentativa da razão.
Mas qual razão? Podendo haver tantas.
A fúria passa às palavras e vomito-as num jacto de bílis sofrida, com que corrói o papel imaculado, inocente ringue, desgraçado.
A minha ira vive nelas, ganha forma gigante, atormenta e atormenta-me, pois que não as controlo.
Corto os meus dedos, mas ainda assim falo.
Arranco a língua e logo ganham vida na minha mente.
Decepar-me não as mata, apenas as perpétua noutros e noutros que nelas encontrarão resposta ao seu estado.
Consolo para cada angústia, cada sofrer igual ao meu.
Eu, eu… pára de falar em mim, de mim!
Não me quero ouvir-te!
Sumam-se da minha vista, mesmo invisíveis e, por isso, tão mais impossíveis.
São apenas palavras.
O Diabo é que são!
São tentação, calvário de que não existe salvação.
Agonizo quando me sussurram e de cada vez que apenas falam, morro.
Mas nem por isso descanso, pois que não mereço.
Eu sei que não.


À margem

por migalhas, em 18.06.08

Acostei à noite, no seu leito estrelado
Nela tentei uma paz que se me amotinava por entre os dedos
Olhei-a passiva, na sua serenidade singular que nos preenche mesmo contra vontade e entreguei-me àquele cenário idílico
Esperei que me acolhesse nos seus braços e me arrebatasse num destemido voo rumo a paragens que ninguém lhe conhece
Aguardei horas, dias ali fiquei, à mercê do que tinha idealizado para alguém como eu
Deixei de ser quem era e por tempo que nem contei de mim me ausentei
Persegui apenas aquilo com que a mente me brindava e nesse estado enlevado fiquei
À noite juntou-se-lhe o mar num festim que me teve sempre a mim por iguaria
Uma e outra a conspirarem a coberto da lua que se fez cheia, agora prenha de mim, ao relento, alumiando-me um caminho que não era para mim
Eu queria a noite e queria o mar e queria as duas emprenhar, os seus corações conquistar, fazê-las minhas todas as noites, mesmo as que não se banhavam na imensa luz da lua
Tentei que a vida fosse minha, agora que lhe conquistara as rainhas, mas ela negou-se
Haveria de viver à sua margem, cansado de tentar atalhos onde tentava entendê-la, sugar-lhe as razões com que me vergastava em troca
Nunca se me confessou, orgulhosa de quem era e sempre seria, sem mim a seu lado
Fui castigado, fui pela vida odiado e dela nem nunca um vislumbre de paixão que me fosse a salvação
A vida que eu queria, tentei-a com a noite, tentei-a com o mar
Nunca a tive, nunca me foi refúgio, mesmo no instante derradeiro, quando me viu naufragar 

Lá longe

por migalhas, em 16.06.08

Era como se fosse sábado sem saber que o era.

A surpresa por detrás das horas que se adivinhavam ao virar daquela esquina inundada de incertezas.

Como o som que antecede o acidente, num destino desgovernado de rumo já sem retorno.

O estômago preso num nó que se socorre de um fôlego que me foge e com ele todo o ar.

Acordar envolto num mar de suor, afogado numa humidade que me tolda os movimento e saber que tenho de a viver.

E depois seguir com os dias, um após outro, num passo trôpego, arrastado.

E depois saber que era o sonho que me mantinha vivo e não o acordar para a crua realidade.

Saber tudo isto e ainda assim vestir-lhe a pele.

Quando tudo o que queria era ser esse sonho, para sempre sonhado e lembrado naquelas paragens tão inalcansáveis que nem em sonhos.

Lá longe, de tudo, do que é a realidade desperta.