"A filosofia funciona como a combinação de um cofre: cada pequeno ajuste parece que não contribui nada para a solução; só quando tudo está no seu lugar é que a porta se abre."
"Se as pessoas não fizessem coisas patetas nada de inteligente seria alguma vez alcançado."
"Mesmo quando todas as possíveis questões científicas estiverem resolvidas, os problemas da vida continuarão intactos."
Vive-se presentemente em Portugal um momento de chauvinismo de certa forma justificado, tudo por culpa de um homem que lá por fora vai dando cartas e com isso fazendo soar mais alto o nome do nosso país. Falo, claro está, de José Mourinho, que neste último fim-de-semana se sagrou campeão da liga Inglesa de futebol. Feito que, por si só, já seria de imensa monta, mas que ganha uma dimensão ainda maior graças ao facto de o clube em causa não obter semelhante troféu há 50 anos! É caso para dizer que teve que ir daqui um tuga, para dar aos apaixonados do Chelsea o título com que sonhavam há tempo demasiado. Mas tal efeito não é novo. O efeito de nos orgulharmos das nossas raízes, das nossas origens. Se internamente é certo que não vejo qualquer razão para orgulhos - vejam-se, apenas e só a título de exemplo, os políticos, que teimam em nada fazer por Portugal, ou os árbitros, que errando consecutivamente sempre para o mesmo lado lá vão empurrando aquele clube da 2ª circular que equipa de vermelho para um título mais do que certo - a verdade é que lá fora há sempre quem nos valha. Um português que, num qualquer ponto deste imenso globo e fruto do seu trabalho e querer, consegue fazer-nos esquecer de todas as nulidades que por cá ficam e que gerem a seu belo prazer este país que, afinal, até possuí muitos e bons valores que parecem apenas revelar-se no momento em que atravessam as suas fronteiras rumo ao estrangeiro. E não é só o Mourinho. Também Manuel José - o único treinador português que se pode gabar de ter dado 7 (!) ao Benfica - se sagrou campeão nacional de futebol no Egipto, país africano onde trabalhou durante toda esta última temporada. E não é só no futebol. Em muitas outras áreas somos confrontados com casos concretos de sucesso de portugueses que, impossibilitados de mostrarem as suas capacidades cá dentro, se propõem ir lá para fora fazer uso delas. Quem fica a ganhar na realidade, nem somos nós, mas sim os países que os acolhem e que com eles - e respectivos feitos - lucram. Nós por cá ficamos todos orgulhosos, todos inchados, mas só e apenas isso. Porque não lhes damos o devido valor quando cá estão - quantos é que diziam mal do homem quando ele treinou cá e hoje o adoram -, porque não temos capacidade para ombrear com as condições que lhes são oferecidas lá fora ou simplesmente porque a nossa notoriedade e cotação aos olhos do resto do mundo não lhes permite a visibilidade necessária ao sucesso. O país anda pelas ruas da amargura e já ninguém se consegue safar das etiquetas de terceiro mundistas com que lá fora nos rotulam, numa sombra escura e pesada que não nos larga e só nos prejudica. Lá vão os tempos em que esta nossa grande nação dominou e conquistou novos mundos. Em que fomos enormes e de uma determinação como hoje não se vê. Ou melhor, se vê apenas em alguns, como é o caso do nosso agora adorado Mourinho. Talvez ele tenha herdado algum do sangue que em tempos correu nas veias de gigantes da nossa história como o foram Vasco da Gama, D. Afonso Henriques, Sacadura Cabral ou o Infante D. Henrique. Ou talvez se tenha simplesmente liberto da carga negativa, comodista e pessimista que se apoderou de cada um de nós e se tenha proposto a levar avante os seus ideais, custasse o que custasse. E se lhe perguntarem se custou, se foi difícil a um tuga vingar num país diferente e de uma outra dimensão, actualmente a anos luz da nossa, decerto o ouvirão dizer que sim. Que foi duro e resultado de um trabalho árduo. Mas não são os feitos mais complicados e que mais luta dão, aqueles que uma vez atingidos maior prazer proporcionam? Sempre foram e sempre serão. Toda a gente o sabe. No entanto, mesmo sabendo-o, por cá teimamos em continuar com esta nossa vidinha de pequeninos, de coniventes com a falta de ambição, apenas a gozar os sucessos dos outros tugas que foram à luta e venceram. Contentes sob o efeito, hoje Mourinho, amanhã sabe-se lá que outro, capaz de fazer pelo país aquilo que, pura e simplesmente, nós nos escusamos. A ter sucesso e a serem protagonistas de feitos que já nos valeram grandes momentos na história universal.