Naquela hora
Naquela hora, que não outra, moviam-se as partes, num todo profundo.
Era a hora, que nunca seria outra, exclusivo irrepetível deste incansável mundo.
Três são os ponteiros, um vagueia vagabundo, enquanto os outros o empurram apressados.
Correm rumo à hora, aquela hora, todas as horas, na sequência que dita o tempo.
E não há quem os pare, quem a pare, àquela hora, que não é outra, mas que se cola e soma a todas as outras, numa corrida que não se ganha.
É deste somatório, sempre crescente, que nasce a aurora que morre a poente e nesse breve ser e estar a luz se faz, para logo se cansar e no escuro se ir deitar.
Naquela hora, num mero instante, apenas aquilo se perfaz e nada mais.
Não adianta querer forçar, o tempo antecipar, prever ou sequer planear, pois naquela hora não mais do que aquilo nela terá lugar.
É assim, sempre o será e nada nem ninguém o ousarão desafiar.
Pois que não sabem, não podem, não naquela hora, nem em hora nenhuma.
Esperou uma vida inteira para nascer e mal se perfaz logo se vê morrer.
Não é uma hora qualquer, é aquela hora.
Eternidade fugaz, apenas aquela, nenhuma outra.
Ali se fez, por instantes vingou, e é num encantatório voo de mariposa que deposita toda a sua essência, depressa feita ausência, coisa distante, a ficar para trás.
Naquela hora foi, aconteceu.
Depois em paz, sem querer incomodar, lentamente se desvaneceu, foi.
Partiu e de si apenas nos deixou a breve marca cravada na carne da nossa existência.
Soubemo-la real, todas o são, somos nós a prova.
Naquela hora foi ela, aquela hora e nada mais.