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TUDO É ILUSÃO, DESDE O QUE PENSAMOS QUE PODEMOS AO QUE JULGAMOS QUE TEMOS.

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Pela Paz. Antologia Poética.

por migalhas, em 01.05.25

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Vem aí novo livro, nova antologia de poesia em que volto a estar presente, desta vez com uma mão cheia de poemas.
Sob um tema cada vez mais pertinente e actual, a Paz serviu de fundo e de motivação aos autores que aqui quiseram deixar o seu contributo, a sua visão, a sua palavra por essa Paz, cada vez mais urgente.
Intitulada “Pela Paz. Antologia Poética”, será alvo de lançamento oficial ao vivo e a cores no dia 27 de Maio, às 16h, no Salão Nobre do Palácio da Independência, (Largo de S. Domingos, 11, Lisboa, mesmo ao lado do Teatro D. Maria II, no Rossio).
Quem quiser juntar-se à festa, será, certamente, muito bem-vindo.
Até lá!

no desfecho

por migalhas, em 03.04.25

no preâmbulo da noite fria

no lusco fusco que faz ponte para o escuro cerrado

ali te vi, parada, perigosamente abeirada

da falésia escarpada

olhar fixo nas ondas desfiguradas

do embate versus a muralha rochosa

e tu, ali, chorosa

a um passo da fatalidade

do voo no breu que, entretanto, se perfez

chegou a tua vez?

não cerres as pálpebras

não te chegues adiante

resiste ao mandante

ao mar que te chama, ao convite da noite

deixaste a mesa posta, a comida ao lume

lá em baixo um gume

afiado, aguçado

e tu sem apetite, senão o de ver aquele abisal destino em ti encarnado

tão bela e impávida ao gélido vento

inebriada pela dor do momento

quebrado o coração

tudo o resto no desfecho 

 

© Copyright Miguel Santos Teixeira (2023)

se pensares cair

por migalhas, em 01.04.25

Se pensares cair

da forma que te apraz

não te desiludas pelo caminho

nada temas ou receies

ou sequer voltes atrás.

 

Do céu cairá uma voz

que te acompanhará

e por guia te será o destino

nesse desamparo em que te verás

de forma e conteúdo

que, contudo, será confuso

e te apoiará, para lá de quem fores ou em quem te tornares.

 

Essa será a tua paixão

a tua queda pelo que queiras

a tu dependência em quantas formas e maneiras

na hora em que respirares de alívio

no instante em que tocares o chão.

 

© Copyright Miguel Santos Teixeira (2023)

encantado

por migalhas, em 28.03.25

Se algo me encanta?

Poemar, as palavras arrumar na desarrumação de um poema por instinto.

O sentir que daí vem, o apego à força dessa construção, num empreendimento

hercúleo, dantesco, ao amor e ao que por ele se sofre, quantas vezes tenebroso, que nunca da razão.

Que não existe razão para tal, neste instinto animal de berrar a plenos pulmões, em convulsões da alma, neste doer que se verte em palavras sofridas e cansadas, que se arrastam ao ouvido e lhe soam tão bem.

Tónicos e suplementos de vitalidade, sem idade ou propósito que não o de embelezar os dias, como música musicada das entranhas da solidão.

Encanta-me a poesia. Como a noite fria em que numa rajada doentia se ergue a voz e tudo alumia na via deste destino. Entre tanto desatino, à força de se querer ser mais que tudo. A via láctea, a Cassiopeia, a viagem de uma epopeia de sangue, alma e que calma, a que se lê e ouve, neste poema. Doce e amargo, num trago embelezado, sem espinhas, todo coração.

Esta paixão escorre-me das mãos ao papel e nele se entrega aos prazeres de uma noite de verão.

Abençoadas as palavras, assim sentidas, assim sofridas, em lágrimas derramadas.

 

© Copyright Miguel Santos Teixeira (2023)

peço-te perdão

por migalhas, em 26.03.25

fecha-se tudo

olhos cerrados, cerrado este coração

verto lágrimas

verto-me em cinzas

peço-te perdão

quero-te comigo

numa viagem à nossa imensidão

para lá de qualquer regresso

apenas a tua na minha mão

de tudo aquilo que te peço

 

o toque, a pele, o olhar

ver-te sorrir, querer-te amar

quedo-me a cada suspiro

por ti morro neste altar

 

esta estrada já me conhece

sigo nela e por ti a percorro

sem mapa ou orientação

na berma colho memórias

do que fomos então

fecha-se tudo

pouco a pouco

peço-te perdão

 

© Copyright Miguel Santos Teixeira (2023)

ando desarrumado

por migalhas, em 24.03.25

Nesta casa não encaixo

tudo nela me é estranho

as divisões desconhecem-me

nas paredes o estuque estalou

e desde então, a confusão

 

em casa de ferreiro, espeto-me no chão

por cada passo adiante, sinto-me dois mais distante

subo aos alguidares, é o mais alto que consigo

não tenho ilusões, vertigens não é comigo

 

tropeço na esfregona, vira-se o balde

tudo por terra e eu ao comprido

no soalho manchado, acumula-se sujidade

pó, cotão, bolor e uma extrema humidade

 

ando baralhado

de divisão em divisão

já não tenho idade

caduquei como cidadão

não me querem no telhado

tentei a cave, também não

 

ando desarrumado

não te encontro em nenhum lado

virei tudo do avesso

eu avesso à mudança

mas, mudaste tu?

Partiste e deixaste-me esta casa?

Que mesquinha se vinga

por não te ter sabido habitar?

 

Sentei-me à mesa, que era a nossa

também ela coxa de coração

desgastada, agastada com a situação

a comida está estragada

arruinada está a refeição

 

que me resta agora

na estranheza deste lar

que de doce tem pouco

e tudo faz para me desagradar

 

vou-me embora, corro porta fora

ver-me-ei noutro lugar

talvez sim, talvez não

se me for permitido lá morar

 

© Copyright Miguel Santos Teixeira (2023)

palavra “vida”

por migalhas, em 20.03.25

o que eu procurei pela palavra “vida”

as voltas que por ela dei

os cantos e cantinhos por onde rebusquei

onde fui, já nem sei

 

o que por ela palmilhei

numa busca que me deu medo

medo de não mais a ouvir, ler

de não mais a ver acontecer

 

eu juro que a procurei, esta palavra “vida”

em becos e vielas, ruas e travessas

se a encontrei, já esqueci

há tanto tempo a vivi

 

© Copyright Miguel Santos Teixeira (2023)

abaixo do chão

por migalhas, em 18.03.25

mais prego menos prego

nas tábuas deste caixão

de nada adianta ao adiantado da situação

 

não me reduz a pena

tão pouco suaviza a dor

desta cárcere eterna

que me espera abaixo do chão

 

esmorecidas vozes

de um coro descrente

entoam os salmos

desta morte eminente

 

cabisbaixos, braços ao dependuro

cegos, surdos e mudos

num leito de corpos em convulsão

desnudos de fé

peganhentos, lustrosos

suadas lagostas em orgias desmesuradas

jazem na terra, abaixo do chão

seis palmos, cessam os salmos.

 

© Copyright Miguel Santos Teixeira (2023)

Hoje

por migalhas, em 24.02.25

Hoje estou ainda mais perto.

Cumpri com mais uma jornada de tantos dias e vontades e sonhos e arrelias,

que também as há.

Hoje sinto-me mais além no tempo, percorridos tantos caminhos, reais, mentais,

alguns atalhos, que também os há.

Hoje sei que continuo um percurso, a que não vislumbro o horizonte, mas avanço,

com mais, com menos, com o que me for sendo possível dar e, no processo,

em troca receber.

Hoje, sou mais eu.

Sinto-me mais em sintonia com algo que não sei expressar, mas que me soma mais identidade.

Hoje, com mais idade.

Amanhã, depois e depois, sem pressa, mas a cada dia mais alinhado com um destino que me constrói,

alicerça e desvenda ao mundo.

Assim me vejo e sinto.

Hoje.

sei-lhe o fim

por migalhas, em 14.02.25

De que me serve dar-lhe início

se já lhe sei o fim?

Começa no zero, acaba no nada.

Ou antes ainda, para se precipitar num depois inexistente.

O que antes havia, depois haverá

sobrevivendo a cada novo começo e ao abismo em que cada um se precipitará.

Esta é a contabilidade, a realidade

insignificante e tão, mas tão, vazia

que não vale um sopro, não vale nada

onde começa e onde acaba.

Agora vês-me, agora já não.

 

© Copyright Miguel Santos Teixeira (2023)