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TUDO É ILUSÃO, DESDE O QUE PENSAMOS QUE PODEMOS AO QUE JULGAMOS QUE TEMOS.

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De que serve escrever?

por migalhas, em 30.03.09

De que serve escrever?
Descrever-me.
Expor cada sentir, cada viver, cada nova aurora e como ela se reflecte em mim.
São vozes voláteis, coisas do momento
hoje é assim, amanhã passado que se fez memória.
E a quem interessa este meu ser?
Este meu coração a bater ou como a cada dia desafio a razão?
Sou eu, por isso apenas a mim digo respeito.
Aos olhos dos outros, sou mera figura com que cada um se cruza.
Em dias aleatórios ou em dias nenhuns.
Na alvorada leve, ainda despida, ou no crepúsculo extasiado, do pôr-do-sol que se anuncia.
Deambulo, aqui em palavras, lá fora em actos continuados, que me fazem mais ser, os dias acontecer e deles cada relato ver nascer.
Aqui, onde me questiono:
De que serve escrever?

eu a dobrar

por migalhas, em 26.03.09

eu queria ser eu, mas vezes dois
poder fazer o que dois como eu poderiam fazer com o tempo de cada qual
eu queria poder fazer tudo o que aos dois assalta e estimula cada ramificação de ambos os cérebros numa ebulição constante que não se cansa e por isso se recusa a dormir
que dormir é tempo perdido
e perder tempo é ver definhar aquele que ainda me resta

eu quero ser duas vezes ou ser só eu mas com o dobro do tempo para me realizar
poder acompanhar quem me é mais e poder ser eu também e mais além
sem a nada me privar, poder de tudo desfrutar
não ter de prescindir para poder seguir
tudo conseguir e poder alcançar

para isso dois, eu e outro como eu, num tempo que se multiplica
para mim, para meu gáudio
hoje vezes dois, amanhã vezes a soma de quanto pretendo ainda criar
sem nunca me vergar ao peso de me ver naufragar
em tanto que poderia e desse apenas quota-parte
a mais ínfima parte de um todo improvável
a fazer-me crer que poderia ter sido tão mais
poderia ter sido tudo e alcançado o que homem algum sonhou sequer tentar

fosse eu dois ou tivesse o tempo de dois como eu
fosse eu a dobrar

duas semanas

por migalhas, em 24.03.09

duas semanas no tempo que é este caleidoscópio de sentidos
espiral de acontecimentos que são pedra sobre pedra
no erguer de um estado que se consolida
a cada dia se ostenta maior
para tal se olhe o teu olhar

duas semanas de tempo
de uma sequência que agora não recua
obstinada em seguir adiante
contra ventos e tempestades
sobre a terra e sobre o mar

duas semanas e já um portento
que nem dá para acreditar
neste tempo físico que se perfez
em ti se fez
em nós se afigura veloz
na velocidade que não olha atrás
apenas obstinada em seguir em frente

duas semanas e tu a par
a seu lado num ombrear feroz
corrida louca que não se cansa
para sempre a certeza de coisa veloz

O que serei

por migalhas, em 20.03.09

Ontem fui Pai, hoje Pai sou, numa missão que não comporta turnos e me toma o tempo que é todo o que tenho e que mais gostaria de ter. Hoje vi espelhado nos olhos brilhantes da inocência, toda a ternura, toda a retribuição de quem ainda nem sequer sabe o que isso representa. Tudo isso eu vi cintilantemente reflectido no seu olhar doce e orgulhoso e preenchido de uma felicidade que nem eu nem ela sabemos pesar, sabemos medir. E ao observar-lhe tudo isso no seu olhar doce e orgulhoso, no seu tímido mas revelador sorriso, vi também o quanto vale ser Pai, ontem, hoje, nos dias todos que hão-de vir. E se hoje ela me disse ser o meu dia, digo-lho eu a ela, hoje e para sempre, que este dia é o seu. Que este dia é a Primavera, é o renascer dos dias repletos de luz, de sol, de tudo o que os seus olhos doces e orgulhosos podem reclamar, pois tudo podem reclamar seus, os seus olhos, o seu afectuoso olhar, a sua enorme figura, enorme presença, num tão franzino ser e estar, um ser e estar de criança que é toda ela inocência no seu mais puro estado. E se hoje sou Pai, com ela orgulhoso partilho esse feito, do mesmo modo a cada dia, soalheiro e reinante na alegria desta nossa Primavera. A sequência será a dos dias, a dos que se seguem numa cadência que não ditamos, apenas seguimos e acompanhamos. E se hoje a Primavera, amanhã o Verão, na certeza de que Pai o serei a cada hora, haja luz e sol e céu pintado a azul, haja água que se precipita do cinzento pesado que nos cobre e quase nos atemoriza. Mas tu não temas, nada temas, nem tu nem a tua irmã, pois aqui estarei, a tempo inteiro, o tempo que é todo o que tenho e que mais gostaria de ter, teu Pai, vosso Pai, melhor do que ontem fui, para sempre vosso fiel protector, a querer-vos do coração, a amar-vos como nada nem ninguém se ama assim. Amar incondicional, na Primavera, no Verão, nos dias todos que agora serão para sempre os nossos dias.

E o que fica?

por migalhas, em 18.03.09

E o que fica?
Para lá das histórias, as que contei, as que ouvi contar, de tudo o que vi, um dia vi e senti com a intensidade de quem olhou mais adiante, sabendo à partida que a vida tem hora marcada com a chegada.

Sempre pouco

por migalhas, em 18.03.09

A paisagem que nos toca e logo nos foge
Um olhar é sempre pouco
Um toque, o sentir, quanto do viver se nos escapa, ainda em vida?
Que a vida é sempre um passo mais rumo à partida

Oito dias atrás

por migalhas, em 17.03.09

Nem um dia a esta hora, oito dias atrás
E hoje a impores já uma porção de tempo que em ti se perfaz
Em ti se mostra e dá a ver
Na força, no querer

Tão depressa como breve a tua aparição
Na rebeldia da fronteira de novo dia
Esse que se fez sem que eu desse por ele
Enfeitiçado que estava em te fazer nascer

Agora já te sinto e no sentir te vejo
Olhos nos olhos e tudo te é permitido
De quanto te espera e te aguarda

Nascer custa muito, não é papá?
Aceno que sim e num sorriso escondo que nascer, morrer, mas mais o entremeio
Aquele pedaço de tempo que se intromete entre esse nascer e esse morrer
Apelidado de vida, por uns, de existência efémera, por tantos outros

Da nossa carne

por migalhas, em 15.03.09

Pedaço de carne da minha carne e da carne da mãe que te pariu

Sangue do nosso sangue e da matéria de que somos feitos

Tu que te quiseste em nós

Que te fizeste por nós

Que vieste ao nosso mundo, agora também o teu mundo

Aquele que será o que dele também quiseres para os que te seguirão

Para quantos vierem a ser pedaço da tua carne, sangue do teu sangue, matéria que foi tua e se materializará uma outra vez nos filhos que parires, na continuidade do que tu és, serás

Então nas suas mãos

Filhos dos filhos dos nossos pais

Feliz assim

por migalhas, em 09.03.09

Quem me são as pessoas senão bichos
Gente que não me entende e eu a eles, todos
Não falo, não ouço, não os sinto e eles a mim
Sou-lhes alheio e eles a mim
Não lhes invejo nada, não os olho, nem nos olhos
O meu refúgio é longe de toda a gente, das pessoas que julgam que julgam e que se pavoneiam como se fossem gente
Gente indiferente, de mim diferente, seguramente
Dessa gente, de toda a gente, eu quero distância
Aquela distância que afasta o dia da noite, o breu do brilho mais ofuscante
De quantos sóis que quando nascem são só para mim
Como eu as detesto, as desprezo
As pessoas
Soubessem elas o que é ser como eu
Soubessem elas o que é viver o êxtase de se saber, como eu me sei
Não depender de nada, nem de ninguém, feliz apenas por ser assim
Feliz assim

SOS

por migalhas, em 04.03.09

Enquanto cá por baixo nos preocupamos com as trivialidades comuns ao ser hediondo em que nos tornámos

(onde se incluem a chacina de diversas espécies rumo à sua extinção, o genocídio dos nossos semelhantes, a prepotência, uso e abuso da força e do poder para subjugar o nosso igual, a destruição massiva da fauna e flora que nos sustenta, ...)

enquanto distraídos com essas banalidades, nem nos ocorreu olhar os céus, o espaço sideral, e imaginar que estivemos a escassos 60 mil quilómetros

(sete vezes mais perto do que a Lua está de nós)

da nossa própria desgraça, ou só da desgraça de alguns.

Que estivemos tão perto de servir de alvo a um asteróide de tamanho semelhante àquele outro que em 1908 arrasou cerca de 2.000 quilómetros quadrados de bosque na Sibéria. E a acontecer, teria sido total a surpresa. Pois que nem os entendidos, os astrónomos, esperavam que passasse tão perto do nosso planeta, tendo sido "por pouco" que o mesmo não nos atingiu em cheio no decurso da sua trajectória.

A sua, ainda assim, modesta dimensão, permitir-lhe-ia arrasar apenas uma cidade das grandes. Varrê-la do mapa num assomo breve de que apenas o rasto atrás de si deixado seria testemunho do seu querer, poder. Não fossem os inocentes, os muitos que certamente pereceriam vítimas desta tragédia, e talvez tivesse valido a pena o embate. Mais que não fosse para despertar consciências ou simplesmente lembrar-lhes, relembrar-lhes, a impotência do homem face aos elementos da natureza que ainda nos cercam ou apertam o cerco num aviso a que deixámos de dar atenção.


Pois que a nossa insignificância e pequenez

(aqui a pequenez apenas física)

deveria ser constantemente recordada, para que a ela nos entregássemos mais amiúde, humildes e respeitosos, conscientes de que só unidos poderemos almejar a salvar as nossas almas.

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